Além do Tabu: Afinal, comer carne de cavalo é prejudicial à saúde?
esde a pré-história, os cavalos selvagens eram considerados fonte de alimento.
A carne é macia, pobre em gordura e rica em proteínas. Hoje em dia, a carne equina faz parte da alimentação de poucos países, a maioria concentra-se no lado oriental do globo, mas também faz parte das tradições culinárias em algumas nações da Europa e América do Sul. Estima-se que praticamente 4,7 milhões de cavalos sejam abatidos por ano para esse fim. Apesar disso, em muitas culturas, existe um grande tabu em relação a esse consumo.
Em países tradicionalmente católicos, inclusive no Brasil, considerado laico, a carne de cavalo já foi associada ao pecado, porque era consumida em festas pagãs. Por causa disso, a Igreja Católica proibiu o seu consumo, hoje ela é liberada, mas muitas pessoas não aderiram ao costume. Além disso, desde tempos mais remotos, o cavalo desempenha funções de trabalho e de estimação que geram certa afinidade dele com o homem. Essa relação de afetividade também contribuiu para o desenvolvimento da aversão ao consumo da carne equina.
Recentemente, foi descoberto na Europa que a carne de cavalo estava sendo vendida como carne bovina em vários alimentos, e essa notícia abalou as estruturas da Europa, repercutiu no mundo inteiro, e gerou outra discussão: afinal de contas, a carne equina faz mal a saúde?
Entenda a polêmica
No início deste ano, foi descoberto que a Findus, marca de lasanha, continha até 100% de carne equina, quando na embalagem indicava que o alimento tinha origem de carne bovina. A notícia surgiu duas semanas após a descoberta de carne de cavalo em hambúrgueres, também no Reino Unido.
A marca Findus, de origem sueca, testou 18 de suas lasanhas de carne congelada, no qual eram fornecidas pela empresa francesa Comigel, e detectou que 11 das 18 lasanhas continham de 60% a 100% de carne de cavalo.
As lasanhas foram produzidas em Luxemburgo, mas a carne era um produto importado da França, e segundo consta, foi na França que a empresa exportadora colocava os “rótulos fraudulentos”. Dias depois, foi confirmada a venda de carne de cavalo, na Inglaterra e na Irlanda, como se fosse carne de vaca. A carne tinha origem na Romênia e foi comprada pelo grupo francês que fornece a Findus.
David Cameron, o primeiro-ministro britânico, declarou que a situação é “completamente inaceitável”. Já a Agência Alimentar britânica (FSA, na sigla inglesa) considerou esta descoberta como uma atividade criminosa, e que os culpados devem ser punidos. As autoridades já mandaram tirar os produtos do mercado.
A fraude fez com que os países da União Europeia se reunissem para discutir um reforço no controle da indústria da carne e uma eventual suspensão de importação de carnes na Europa. Estima-se que onze países possam ter vendido carne de cavalo disfarçada em produtos nos quais o rótulo indicava carne de origem bovina.
Agora, a União Europeia está intensificando os testes de DNA nos produtos de carne, na tentativa de determinar melhor o que está acontecendo com o alimento vendido no Reino Unido. A Grã-Bretanha e os Estados Unidos continuam firmemente contrários ao abate e consumo da carne equina.
Afinal, a carne de cavalo faz mal à saúde?
Embora toda a polêmica esteja em torno da prática criminosa, que foi a fraude, o que as pessoas realmente querem saber é se a carne equina, de fato, pode fazer mal ao nosso organismo.
A resposta é não! De acordo com especialistas em nutrição, apesar do aparente e inabalável tabu envolvendo a alimentação com a carne de cavalo, o alimento pode ser muito mais saudável e rico em proteína do que os outros tipos de carne.
A nutricionista Martha McKittrick afirmou: “Como a carne de búfalo, ela [carne equina] tende a ter mais músculo, por isso tem menos gordura. É também muito rica em proteínas e rica em ferro”. Apesar disso, McKittrick não defende o consumo desse tipo de carne.
Já a nutricionista Esther Blum declarou: “Profissionalmente falando, [a carne equina] é uma alternativa muito melhor do que a carne bovina, porque com a carne convencional, os animais são alimentados com soja, milho e cereais, que os torna pro-inflamatório. Considerando que, com cavalos, eles são definitivamente uma carne magra e não expostos a hormônios ou antibióticos”.
Blum também observou que as vacas ingerem muitos pesticidas, e esses compostos químicos prejudicam o sistema endócrino e podem levar à obesidade. Os cavalos de pasto, por sua vez, não consomem esses compostos, por isso são mais saudáveis. Entretanto, tudo depende da alimentação desses animais.
A polêmica afeta o Brasil?
Embora a fraude seja um problema interno europeu, a polêmica pode sim afetar negativamente a economia brasileira, segundo a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes que recentemente vem estudando quais são os prejuízos para o produto brasileiro no mercado internacional.
O Brasil é um dos maiores produtores mundiais de carne bovina, e é o segundo maior exportador. Em números, foi exportado 1,13 milhão de tonelada do alimento no ano passado, o que significa um aumento de 13,4% em relação ao ano de 2011. Esse crescimento representa um recorde em termos financeiros, pois a receita foi de 5,77 bilhões de dólares, aproximadamente 11 bilhões de reais. Os três principais destinos da exportação brasileira é a União Europeia, Rússia e Hong Kong.
Fernando Sampaio, diretor executivo da associação, disse que a imagem da carne em geral é imediatamente afetada: “As pessoas ficam desconfiadas e o consumo baixa bastante”, explicou ele em entrevista ao site da revista VEJA.
O consumo de fato está diminuindo. Segundo uma pesquisa encomendada pelos jornais britânicos Sunday, Mirror e The Independent on Sunday, quase um terço dos adultos na Grã-Bretanha pararam de consumir alimentos prontos, e 7% pararam de comer qualquer tipo de carne.
Ainda, de acordo com a pesquisa, mais da metade dos entrevistados se mostraram a favor da proibição da importação de carne até que a real origem seja verificada e divulgada. 30% dos entrevistados acreditam que o governo britânico não está sabendo lidar com a crise. Em contra partida, 44% discordam, e acham que o governo respondeu adequadamente.
Em meio a tanta polêmica, uma coisa é certa: quando uns erram todos sofrem as consequências. O jeito é esperar para ver os próximos capítulos dessa história que parece ir longe.